tag:blogger.com,1999:blog-59612587762503384712024-03-13T21:16:51.642-07:00Melancólicos Anônimos"Como se tudo que eu possuísse tivesse me deixado, e como se nada pudesse ser o bastante caso retornasse..." (Kafka)Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.comBlogger383125tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-79623277500290503512015-09-03T21:09:00.001-07:002015-09-03T21:10:05.439-07:00para além do bem e do mal<div class="MsoNormal">
olhar sua foto para fora da nuvem dos remédios,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
acariciando um gato, o cabelo por sobre os óculos;<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
olhar sua foto para além das tardes nos pisos frios,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
da esperança de um café, das celas dos suicidas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
lembrar da filosofia alemã que escorre pelo teu braço,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e que num dia qualquer
a ouvi dizer “você vai<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
perceber que está tão errado em me querer”...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas saiba que com isso você contraria o alemão de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que tanto gosta, pois esquece que somos maiores que a vida.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
somos fortes o suficiente pra encarar os pulsos abertos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as drogas controladas no armário do banheiro.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
somos fortes pra dizer “sim” a vida, com a mesma avidez<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que digo “sim” a visão absoluta dos seus peitos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
somos fortes como eu tenho de ser ao encarar esse dia <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
feito em escombros por descobrir, através de uma fotografia,<o:p></o:p></div>
que longe daqui você ainda é capaz de existir sorrindo.<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-56359374593957691762015-09-03T21:08:00.002-07:002015-09-03T21:09:06.839-07:00“se eu dissesse que estive no seu coração”<div class="MsoNormal">
num ímpeto repentino arrumar o quarto de estudos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
me pôr a jogar tanta coisa fora e, entre os livros, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sem querer, topar com a crua caixinha esquecida.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
todo movimento entra em suspensão: há ali um catálogo de
amores.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
de alguns ficou apenas o 3x4,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de outros os poemas, as cartas, as fotografias.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e teve um, apenas um, que ali dentro deixou tanto:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
declarações no meio do dia, bilhetinhos súbitos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
bijuterias, o anel carcomido de ferrugem...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
pensei também naqueles que não deixaram rastro,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que não a memória do volume de suas clavículas e omoplatas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
mas no dia de hoje alguns andam desaparecidos no mundo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
outros aparecem e desaparecem respeitando os mecanismos da
vida,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas a maioria esmagadora está casada e tem seus filhos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e eu ainda aqui, sozinho, nesta mesma cidade,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
arrumando livros, roendo as unhas, e criando gatos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
não queria admitir, mas amassar cada recado, cada
fotografia,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
foi mais duro que dobrar folhas de chumbo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e a verdade é que sou bem triste: à minha vida<o:p></o:p></div>
só serve o que não fica para sempre<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-42103340725989318052015-08-01T06:11:00.001-07:002015-08-01T06:18:28.860-07:00O MAIS PERIGOSO EM UM TIGRE SÃO OS OLHOS<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">quando você chegava nos fins de semana,</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
eu tinha minha parcela semanal de perigo:</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
eram dois dias inteiros trancados no</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
apartamento com o tigre.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
<br />
mas agora não há mais tigre,</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
o pó de café dura o mês inteiro.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
<br />
portanto, adeus às suas unhas e dentes, ao seu cheiro de boas vindas.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
adeus ao seu rímel, sua escova cacheadora, seus m&m’s coloridos;</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
adeus aos noturnos fios dentais, adeus à beckett, ao meu nome italiano...</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
<br />
e se ainda assim</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
eu disser que tudo é exílio fora dos seus pequenos enfeites,</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
sim eu sei, você vai rir e confirmar a nossa teoria de que</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br />
eu fui o bicho mais brega que já invadiu a sua praia.</span>Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-25123927318538649752015-07-09T18:49:00.001-07:002015-07-09T18:53:15.721-07:00<div style="font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.3199996948242px; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
<div class="MsoNormal">
<div class="MsoNormal">
<span style="line-height: 19.3199996948242px;">foram longos os anos até esse beijo chegar,</span><br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e ali, naquele grão de receio e desejo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
fomos bonnie e clyde
engatilhando as armas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
rodin e claudel esculpindo um futuro possível .<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
em essência, sempre fomos (e seríamos) dois vagabundos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
lembra? o plano era esse, e era infalível: nós<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dois roubaríamos um daqueles quadros de picasso<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e, gargalhando, o entregaríamos aos mendigos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
fugiríamos com a roupa do corpo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e aí criaríamos nossos filhos em lumiar,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nus pela vida afora, entre as paredes cor de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tijolo, sob os telhados de madeira úmidos de sereno.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
eu seria aquele coroa de corpo malhado e<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
você a menininha dos dreads, e chocaríamos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os caretas: um cara preto com o dobro da sua idade<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
escrevendo poesia com cacos de vidro em brasa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas seríamos os dois contra o mundo, despedaçados<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de amor num labirinto dos espelhos quebrados, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
essa espécie de afeto do qual não sentimos os<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
atravessamentos: pois
é um amor macio, como é<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
macia a faca na carne de quem terminou de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dormir com o seu assassino.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e o convívio mitigaria tudo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
eu logo me cansaria da sua juventude, pois<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nunca aprendi a lidar com intensidades.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
para me salvar disto, cultivaria meus cactos arredios <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no deserto das tuas tranças: ainda que o sol insistisse em caminhar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sobre os teus cabelos oleosos, mal lavados, despenteados,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
eu seria seu contrário, seu yin, eu seria os dias chuvosos
na tua vida.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e você, por outro lado, essa tua mania sorridente<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de me achar o melhor de todos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
se desfaria nas horas das conchas e das sementes,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nas horas silenciosas das pinturas esotéricas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
chegaria, numa explosão, o tempo da mágoa. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
brigaríamos como brigam os casais do cinema, e assim<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
você me descobriria como realmente sou: sujo, barbudo e
triste.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
então você iria embora, me deixando sozinho, indefeso,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
entre cães, estantes de bambu, e crianças descalças.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas te buscaria no vento (farejando teu cheiro de bicho<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
igual ao das mulheres sem vaidade), e te encontraria, sobre<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as pedras abafadas da cachoeira, e seria uma<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
visão tão absoluta que eu teria medo de desfaze-la.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e o impulso de dizer que te amava seria irresistível,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mesmo me sentindo ridículo e velho, chegaria a você e<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
te abraçaria com força, mergulhando teus peitos em meu<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
corpo, e isso seria como dizer que te amava sem ser ridículo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
olha, você seria minha mãe de 20 anos, e eu, o seu filho de
40.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e esse poema que recria dias que não virão é só<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
uma forma de dizer que ali, em cada segundo daquele<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
beijo arquitetado e criminoso, fomos (seríamos) o<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
casal mais feliz e bonito dessa porra de vida inteira.<o:p></o:p></div>
</div>
</div>
</div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-10419528587105905812014-11-23T06:00:00.001-08:002014-11-23T06:00:41.056-08:00videogames<div class="MsoNormal">
trago nos olhos o olhar de todos os cães de rua do<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
bairro, asilo no peito os vagabundos, os depressivos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mulheres se perderam na água parada dos dias,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os jovens casais voltando do supermercado:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
eu vivo a cor de um deserto que não cessa de se recriar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
é sábado a noite, a chuva ainda agora parou,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
resta o silêncio que move o motor do ventilador.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e ainda teus rastros cindindo veios em brasa <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pelas estruturas do
apartamento, a planta<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
da área de serviço ressecada de tanta sede.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e ainda as gavetas como bocas escancaradas <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
bafejando o invencível cheiro de amaciante e lycra<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das tuas roupas íntimas que ali se entricheiraram. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
videogames, cinema francês, monografias:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
resiste a tudo a imagem da tua faca entre os dentes,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das tuas unhas dolorosamente pintadas dentre as grades do
portão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
hoje o amor é esse feijão que cozinha na panela.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-38683909909370098162014-09-26T08:04:00.002-07:002014-09-26T08:12:52.214-07:00quando este incêndio terminar,<br />
venha aqui antes dos bombeiros,<br />
e não atente ao meu corpo devastado pelo fogo.<br />
procura pela casa ainda em brasa, uma blusa,<br />
uma carta, um souvenir qualquer de mim.<br />
<br />
<br />
deixa ali meu corpo aniquilado,<br />
não se preocupe com a incandescência<br />
revelando em minha carne calcinada as<br />
marcas das tuas facas, dos teus dentes,<br />
das unhas coloridas, dos teus beijos a queima roupa.<br />
<br />
<br />
pega algum objeto do meu quarto, leva contigo: <br />
ele será o ovo da fênix,<br />
o meu eu triunfante sobre as chamas.<br />
carrega-o pela tua história mesmo que amanhã<br />
de manhã um novo amor despenteie teus cabelos.<br />
<br />
<br />
vá embora sabendo que é teu o que possuí:<br />
o que sempre foi o melhor de mim.<br />
<br />
<br />
***<br />
<br />
lembra de mim como alguém que amou te<br />
olhar dentro dos teus vestidos coloridos,<br />
lembra de mim como alguém que criava<br />
mapas do tesouro no teu corpo e, <br />
me agarrando as tuas costas,<br />
sempre marcava com um xis a soberba<br />
geografia da tua nuca descoberta.Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-27832947835300220422014-06-21T11:37:00.001-07:002014-06-21T11:37:26.732-07:00<div class="MsoNormal">
dizer n<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o ao
cotidiano, querer os dias do caixeiro viajante.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a pele incorrupt<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">í</span>vel das
mulheres da g<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>vea.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
aquele rosto euroc<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ê</span>ntrico
de 20 anos atr<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>s<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cindindo, hoje, a
impiedade das avenidas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o rosto, outro rosto,
que envelhecer<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span> comigo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
atrav<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span>s dos
tempos burgueses.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a noite da zona sul, a
neblina que n<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o existe<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dentre os pr<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span>dios, invadindo
as lanchonetes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a tua voz grave me
encorajando os pulsos cortados,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ou os far<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ó</span>is de
santa rosa anoitecendo outro mundo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a lapa (ah a rua da
lapa), a cerveja, a urina<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(fridas kahlos dentro
da urina).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o encontro s<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ú</span>bito, a
solid<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o
do televisor.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os cartazes dos bailes
funk em madureira convidando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
aos velhos crimes
embebidos em <span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>lcool e vagina.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
acordar cedo, a caneca
de caf<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span>
com leite,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
um artigo sobre
fellini no incans<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>vel monitor.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estar em cada gesto de
m<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o
que acaricia,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de lado a lado, esta
lua rubra.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
derramar absurdos sobre
a cidade me faria feliz.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as pastelarias
encardidas, as manh<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>s mansas de pequim,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o toque dos dedos e
dos olhos da mulher chinesa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
t<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o perto,
mas n<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o
aqui: na dist<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">â</span>ncia s<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ó</span> posso te intuir:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nas m<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ú</span>sicas
que passaram, todas as outras que vir<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
me perdendo em f<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>bricas
noturnas, casas abandonadas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pr<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span>dios de
um s<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span>culo,
quintais praieiros, e na geografia<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
errante dos teus bra<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ç</span>os.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
bares de esquina,
igrejas escuras sob a manh<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a cidade a noite: um
seurat de neon e led.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
na cidade nada nos
choca, nem a viol<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ê</span>ncia e<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nem o amor: na cidade
os dois se confundem.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as entranhas do sub<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ú</span>rbio, v<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">í</span>sceras
do concreto mofado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tu caminha, a pele
limpa nestas cal<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ç</span>adas sujas, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o teu cabelo num
movimento pendular trazem,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
como num enigma zen, saudades
do que n<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o
se viveu.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mini shorts, minissaias,
a brisa evola o cheiro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de sexo perfumado por
urina e lycra.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
helenas sob a luz de
necrot<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span>rio
do metr<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ô</span>,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ou ainda sob o sol <i>high definition</i> de janeiro.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o anjo de klee, com
sua cabe<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ç</span>a
torcida, bate suas asas <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sobre estes dias do
longe, e sente tristeza.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a meia luz quando
anoitece, o odor lento<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do piso de madeira, o
tic tac do rel<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ó</span>gio incans<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>vel,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os quartos do
apartamento na mem<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ó</span>ria infantil.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as luzes de poeira e
xenon de dentro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do teu carro pelas
noites de sonho<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(laranjeiras pulsa
ainda que adormecendo).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
blusa rasgada, barba
por fazer, no bolso <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
alguns trocados, e teus
convites querendo me<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
fazer bordar uma l<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span>grima.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
a vida se encurta em
tempo e espa<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ç</span>o, e eu<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sou o grande charlat<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o, o
amante,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o assassino de mim e
do outro:</div>
<div class="MsoNormal">
e este <span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">é</span> um
poema para quando n<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">ã</span>o mais houver.</div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-73126337633319503342014-06-16T15:37:00.001-07:002014-06-16T15:37:33.874-07:00inventário de ausências (ou das anticoisas que tu deixastes)<div class="MsoNormal">
1) as fotografias que não dissolverão nunca<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a tua imagem do tempo destes olhos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
2) um ou outro fio de cabelo teu pelos lençóis,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que encontro como se encontrasse uma alegria<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
3) os brincos sobre a cômoda, e dentro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
deles um desejo de que, como quem não<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quer nada, tu os venha buscar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
4) o vestígio da palma da tua mão na porta<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do armário: o índice dos teus dedos frágeis<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
5) teu cheiro habitando na blusa que coloquei ao<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
lado do travesseiro e que, durante a sonolência,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quase faz parecer que estás aqui<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
6) um barulhinho de saudade naufragando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tarde adentro (pode escutá-lo?)<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
7) a fantasmática do teu corpo nu na varanda: a<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
miragem da vênus de botticelli fumando um cigarro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
8) e um enigma: este corpo grande e musculoso<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
curvado sob o peso deste pequenino sentimento<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-30056520951100931442014-06-16T15:36:00.001-07:002014-06-21T11:37:48.603-07:00oberon e titânia<div class="MsoNormal">
fincou os pés no verão e fez<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
da estação o território da tua presença:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
na cor de sangue do fim de domingo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
escorrendo sobre os dois irmãos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nas horas de literatura (a filosofia do amor):<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no grande e no pequeno tudo és tu. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
tua presença és isto ainda: <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
teu cheiro misturado ao óleo diesel<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das ruas claras, teu cheiro naufragando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
entre uma onda e outra dos lençóis recém lavados:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no infinito e no ínfimo tu estás. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e nestas ilhas de espera, dentro do <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
intervalo que se abre quando não estás , <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
fugir das horas que insistem em gravitar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a volta do desejo do teu umbigo:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
qual o afazer mais digno do que<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
levitar o pó destes livros,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sentir saudades tarde adentro e,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ao anoitecer, me abrigar de ti e esse teu<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estranho vício de atear fogo em satélites?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
eu, que nas noites acesas de janeiro, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
te habitei no escuro, e não soube mais voltar:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pois que tuas clavículas são a coisa mais bonita da praia,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tuas omoplatas a coisa mais bonita da festa,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas é sobretudo o teu rosto que me acalma, como o <o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
sol acalma a varanda numa manhã sem trabalho.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-58143465919705267172014-06-16T15:34:00.001-07:002014-06-16T15:34:50.043-07:00<div class="MsoNormal">
por hora cansei desta humanidade.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ponho-me aqui, este cão a destilar a<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
alma das ruas concretas, a contar as<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
crateras das luas foscas de fumaça.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
devo te confessar encontrar prazer na<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
solidão do uivo, no farejar insistente<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das simetrias do meio-fio:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pode tu abarcar tanto abandono?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
não te ofenderá a visão desta boca<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cheia de dentes de onde pende<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a língua desavergonhada?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
não quero também as mãos: as patas terão<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a impossibilidade de manusear mais estragos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
já me irrita a fala, a angústia de homem que,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
em mim, sempre brotou fortemente:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quero a alegria vazia e pendular, sem<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
filosofias, de um simplório abanar de rabo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
só isso e um raro afago por dentre as orelhas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas me diga: tu pode perdoar, e abrigar em ti,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as pulgas que carrego pela vida?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e desviar de automóveis que vem e vão,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e nunca, ainda que sobreviva até a velhice,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
entender a causalidade da chuva.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
sentir o cio como um delírio ancestral.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas caberá ainda o amor neste corpo peludo?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
virá de uma esquina, de uma praça, de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sob as marquises mofadas e úmidas?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
será grande ou pequeno, dócil ou feroz, o amor?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
da existência de homem só guardarei<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
isso a que chamam de amor: a lembrança<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do teu riso derrubando os livros,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a portaria do prédio na névoa do leblon,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o mísero osso que me jogaste, furiosamente,<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
através da sépia contraluz de tua janela.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-14800656206511426172014-06-16T14:19:00.001-07:002014-06-16T14:19:47.712-07:00<div class="MsoNormal">
desce o bordado lentamente,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cada fio, fiapo, dobra e poeira,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a trama microscópica do tecido ondula.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
aos poucos, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
como rosas que se abrem, via-lácteas explodindo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cada mancha infinitesimal da tua carne faz aparição.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ainda cada sombra sobre os mínimos volumes musculares:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nos poros posso ver a ascensão dos pelos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e neles enxergar a exalação lenta dos teus cheiros.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
o instante me olha tão nitidamente que quase decifro,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no padrão da tua pele, o rosto dos teus antepassados.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
mas voltar a si é voltar ao todo:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tuas costas nuas emergindo do casaco descendente,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
violentamente afogando a gávea inteira,<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
na realidade incontornável das tuas omoplatas.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-83277383871153594562014-06-16T14:16:00.001-07:002014-06-16T14:16:27.802-07:00<div class="MsoNormal">
quando ela foi embora, catou laboriosamente todas as roupas,
os badulaques inacessíveis, os fios de cabelo espalhados pelo chão. quando ela
foi embora levou quase tudo, menos as peças íntimas, as camisolas: essas ela
deixou submersas na gaveta, a última de cima pra baixo, pois havia decidido, já
sem nenhuma mágoa, que de agora em diante dormiria o resto da vida
silenciosamente nua. isso era símbolo e prenúncio de uma mudança de existir,
uma troca de pele, um desancorar-se.
ainda não chovia aquela manhã, ainda não. iria chover mais tarde, pois
ela acordou agarrada na certeza de que não havia felicidade ali, e isso desenhou
a promessa de algumas nuvens no céu daquele quarto. e ele, triste e estranho
como era toda vida, ficou ali, imóvel: uma relíquia de alguma civilização
antiga recoberta de pó. tropeçando nos livros, desrespeitado pelas gavetas, o
cômodo azul escuro: um cheiro infinito, a
possibilidade da mudez, e da criação delicada de várias espécies novas de
solidão.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-58926586282138037662014-06-16T14:02:00.002-07:002014-06-16T14:06:36.206-07:00<div class="MsoNormal">
este poema é pra ti que me esquece, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
grávida de narciso,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no contraste das fotografias.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pra ti, que se veste e se despe sem me olhar,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e não percebe que tua nudez é toda viva<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e comigo troca olhares surdos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
pra ti que, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mesmo trazendo nas veias a pulsão orgíaca de teu antepassado,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ainda tem o disparate de sonhar com automóveis.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pra ti, este diamante bruto que lapido e contamino,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e que firo a pele escassa com minha delicadeza de canalha.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
pra ti que lança a voz de clarice no vento do aterro,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a voz de hilda através dos abismo deste quarto,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pra ti que ri dos casais, que a eles trama histórias,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e sabe que isso é como um amar junto.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
estes versos vulgares, rotos, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
são pétalas postas ao chão por um poeta vulgar e roto,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pétalas úmidas de breu e gozo, pra ti que,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sobre a cômoda abandona a marca dos copos,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
restos de cigarro e fósforos consumidos ante<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ajoelhados deuses dos mortos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
este poema é um recado de amor pra ti, poeta do século XXI:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a cama posta (vestígios e indícios da tua insondável
inteireza), <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
só quero te devorar pelo dia adentro,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
passar a vida inteira comendo-te com língua e linguagem:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
povoar a terra inteira com uma nova raça de poetas mestiços.Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-63717761116157714212014-06-16T14:02:00.000-07:002014-06-16T14:05:24.855-07:00 <i> (para keats)</i><br />
<br />
longe de casa numa
chuvosa<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
madrugada de
sexta-feira<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
neste hotel de quinta:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a televis<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o ligada
horas adentro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(filmes mudos,
pornografia),<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e as paredes mofadas
secretando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
um abismo lento que
escorre<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sobre os m<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ó</span>veis
antigos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
o frio, a lembran<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ç</span>a almiscarada<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das mulheres de
cachecol e botas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que vi pela rua mais
cedo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
uma sensa<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">çã</span>o de
estar disperso, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
melancolicamente, na
exist<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ê</span>ncia
das coisas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
de olhos postos sobre
o cinzeiro vazio<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(o nome do hotel j<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">á</span> se
apagando), <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pra quem nunca fumou,
um desejo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de cigarro, duma
garrafa de vinho: <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quem sabe assim se
sentir o derradeiro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
poeta rom<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">â</span>ntico
comungando com o fim.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
tudo conspira para que
se viva de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
forma acesa a experi<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ê</span>ncia
desta solid<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ã</span>o.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<i>(teres<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ó</span>polis,
09 de maio de 2014)</i><o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-66848708981497830492014-04-09T23:10:00.001-07:002014-04-17T03:54:56.577-07:00<div class="MsoNormal">
pois que <span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">é</span> um
homem sem<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sua parcela de sil<span style="font-family: "Times New Roman","serif"; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-font-family: Calibri;">ê</span>ncio?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
aquilo que cala, aquilo
que omite,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tem o valor das coisas
secretas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
deve haver,
nesse homem,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
espa<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">ç</span>o para algo de desertor,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
algo de
amotinado:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
rebelar-se
<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">é</span> um estar s<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">ó</span>.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e o que
resiste <span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">é</span> o insond<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">á</span>vel:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
um homem deve ser o<o:p></o:p></div>
seu pr<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">ó</span>prio mar
noturno.<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-59347166673789726502014-02-03T03:57:00.003-08:002014-02-03T04:03:56.632-08:00<div class="MsoNormal">
e acordar nesta manhã de domingo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sentindo tuas mãos brancas, suadas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
como um aracnídeo albino, tentando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
violentamente sufocar as batidas deste<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
coração ralo, e num sobressalto ligar o<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
rádio no último volume assustando os<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
vizinhos e implodindo a lentidão da casa. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e sorrateiramente, o cheiro de café<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
esbarra nos livros e ele traz em seu<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
rasto o odor de nicotina que não existe,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas que era o que escapava dos teus<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dentes junto as
músicas que só nós,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os dois sobreviventes do pós-amor,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
conhecíamos. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
nunca gonzaguinha, com quem o rádio<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
me golpeia sorrateiro, soou tão triste.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
me pôr a jogar furiosamente as<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
roupas do armário sobre a cama,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pelo chão inteiro, e entre o mar revolto<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das camisas, das calças, das cuecas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
meias e lençóis, se permitir a calma<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de um copo de leite, que tomo como<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o desjejum de um soldado, que nas barricadas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sabe que pode morrer longe de ti, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
com alguma carta ríspida endereçada a ti,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dobrada, manchada de sangue e pólvora, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no bolso enlameado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
mas a calma passa, as balas não chegam,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
meu exército ao teu ergue a bandeira branca.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
rearrumar as roupas em outra ordem,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
silencioso, numa hora em preto e branco, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
como um ator de cinema mudo, engolindo a<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
poeira das prateleiras que me fazem tossir<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estes ciúmes amarronzados que me irritam<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a garganta e fazem meus pulmões rolarem<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
por abismos que crio, como crio as cores<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estroboscópicas da festa onde não pude ir<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
com medo de aumentarem os desertos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e olhar as camisas todas dobradinhas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as bermudas nas gavetas onde guardei<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tuas clavículas insones, e achar que está<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
terminado o trabalho de um século, este<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
trabalho que calou a voz de todos os poetas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
aqueles que mostrei a ti, e os que não<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mostrei, por não haver tempo de viver<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a voz obscura e amorosa de todos eles.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
pois tu, foi este pedaço de perda e de dano,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e com estas unhas descascadas, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estes caídos olhos saídos de um quadro de modigliani, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
foi um pássaro numa paisagem impossível,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
um samba antigo numa casa amarela,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tu foi um samurai infalível fatiando a carne<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
barroca e acesa do verão (o verão sangra azul).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
fechar o armário, as portas de correr como<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as cortinas de um palco onde dancei<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sob a chuva torrencial dos punhais que tu<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
usava para fazer os coques dos teus cabelos afiados.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e se dar por satisfeito por ter arrumado este<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
guarda-roupas entristecido e, me olhando nu, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no reflexo fílmico destas portas, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
enxergar o corpo ainda intacto:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
isto é querer sobreviver a ti.<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-75612372105389556252014-01-30T07:27:00.001-08:002014-01-30T07:29:41.124-08:00invasões bárbaras<div class="MsoNormal">
andar pelo quarto pequeno, este<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quarto que muitas vezes serviu de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
descanso, e agora não o reconhecer mais.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sacar um livro da estante e ouvir a <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
parede de livros dizer não querê-la<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
aqui: é um modo do poeta estar só.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as teias de aranha cresceram numa<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
única noite e, ao menos por hoje,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus aracnofobia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o pó recobre a cômoda, o violão desafinado,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a luminária que não acenderá mais...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as gavetas emperram: e agora, onde guardar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tuas clavículas?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e rodar desnorteado a casa em escombros,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
bombardeada, mas ainda de pé, e saber<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que mesmo assim, mesmo desertas da tua<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nicotina, copacabana permanece ilesa, a lapa<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
intocada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
recolher as contas a pagar na caixa de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
correio; elas chegam pontuais, não supõem <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a tristeza: “as coisas não precisam de você”.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
receber convites pra dançar, é verão<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tudo é jovem, e nem ao menos os poder responder:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o teclado do computador trava, o telefone está mudo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as canetas falham miseravelmente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
as portas não abrem, as janelas dão para lugar algum:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
não há gatos apaixonados aqui, com seus miados<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de amor e suas cores trocadas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o que há aqui é esta barba crespa que<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cresce em tamanho e desejo do emaranhado<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dos teus fios de cabelo recém-escovados.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o que há ainda aqui são estas duas mãos, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estas unhas roídas que expõem a ansiedade de,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
até o amanhecer, esquentar os teus dedos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
tentar, num filme de truffaut, entender<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
toda esta aridez dentro de ti, já que as fotografias<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
te contrariam: denunciam friamente que teu<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
rosto é tão mais bonito sorrindo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(mas nem truffaut, nem truffaut!, pôde responder). <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e rearrumar o armário, as prateleiras, e no<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
entanto encontrá-la escondida ali, esbarrando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
na realidade, atrás da caneca de café, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a arma em punho, o cano na minha têmpora.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
surpreende-la gargalhando por detrás da<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
televisão, a boca aberta, todos os dentes<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
prestes a mastigar meus tristes joelhos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
no espelho do banheiro são teus olhos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
caídos, teu corpo de golfinho, minha carne<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
escura onde escreveste “alguém vai ler”<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
com ferro em brasa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e na varanda me vem a vontade de incendiar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
todas as casas do bairro, e te maldizer em cada<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
uma delas, a tua insensibilidade: não havia<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
medo no acariciar das tuas clavículas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
havia amor, o que é bem parecido.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
***<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
quando dançamos sozinhos, no meio<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
da fúria do calçadão do leme, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
não havia dor ali, havia?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
te ofereci a chuva jovem poeta:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
você poderia viver a tua tristeza na <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
distância e seca, ou poderia trazê-la pra<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
dançar dentro de um dia de chuva.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
o crime é não me deixar tentar:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
molhar essa tristeza, despentear essa dor.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-59396142502030171832014-01-30T04:00:00.001-08:002014-01-30T04:00:56.923-08:00na existência da madrugada<div class="MsoNormal">
as 5:29 da manhã,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a foto onde tu expões tuas clavículas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sob a primeira luz,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cruza sobre os prédios como um raio<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e parte ao meio a existência da madrugada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ponho-me pequeno diante tuas tristezas:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
uma gota contra todas as correntezas do mundo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e dedico as horas assim,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
neste trabalho de dor,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
atirando em ti as flechas que arranquei<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do próprio colo, para ter de vê-la<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
congelá-las em pleno ar...<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
coloco-me em saudade dos teus seios,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estes oceanos para onde traio meus navios,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os enviando para a certeza do naufrágio<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(no entanto, navegar os lábios pelos teus<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ombros, pelas tuas omoplatas e coluna,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
é uma silenciosa tentativa de fazê-los resistir).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
e já nos afazeres da manhã partida,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
encontro teus cabelos nas roupas pra lavar:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
fios de inverno no dentro do verão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pondo o lixo pra fora olho o céu absurdo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e creio na impossibilidade de continuar ateu:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tu não sabe jovem poeta,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas no território das nossas noites eu vi<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
brotarem terríveis e magníficos deuses<o:p></o:p></div>
de cada parte do teu corpo.<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-78865390201114410202014-01-26T03:59:00.001-08:002014-01-26T03:59:56.165-08:00hotel marinaqueria ao menos destes dias,<br />
um diamante, uma pedra que seja.<br />
uma pedra com a forma destes dias,<br />
com a textura destes dias,<br />
com o peso, com o cheiro destes dias.<br />
para que ao exibi-la pelos bares,<br />
nos salões, pela ruas do centro,<br />
todos pudessem contemplar nossas horas<br />
e dizer maravilhados:<br />
“então além de poemas este kavita kavita<br />
é capaz de criar dias de paixão assim?”<br />
e então você não seria mais a sombra<br />
e uma brisa, você dissiparia seus medos<br />
na chuva das pequenas fotografias.<br />
<br />
um primeiro abraço sob a luz fria do metrô,<br />
o rápido por do sol sangrando a praia e tuas clavículas,<br />
teu corpo nu entre as cortinas amanhecidas,<br />
teu sono de criança sobre o meu colo:<br />
este poema sou eu, a caixa de imagens, um relicário.<br />
<br />
quando eu morrer estes instantes<br />
se extinguirão de qualquer memória,<br />
mas estes versos ainda resistirão<br />
nas páginas de um livro, inscritos<br />
em algum lugar, onde as gerações futuras<br />
poderão lê-los e saber que poucas<br />
coisas na face da terra puderam ser tão<br />
cruelmente delicadas do que te ver<br />
sorridente, com aquele vestido verde,<br />
descendo lentamente as escadas do prédio.Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-30353132044534732272014-01-25T21:50:00.001-08:002014-01-26T04:00:46.301-08:00forte de copacabana<div class="MsoNormal">
como se fosse uma fotografia,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
toma em tuas mãos as dimensionalidades<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do dia: amassa-o, rasga-o, e joga fora.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
depois daqui jovem poeta, talvez, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
eu pare de te assustar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cultiva tuas desatenções nos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
desertos do meu desejo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
eu, esta terra desolada de ti, esta<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
solidão sem nome e profundidade.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tu, apenas tu, que deitada sobre<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a pedra, sob a sombra dos canhões,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
diz ver o céu mais próximo do teu corpo-praia,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sem notar o poeta mais velho admirando<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
teus pés brancos fincados sobre o chão<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
escuro como minha própria carne.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
olha, meu coração é frágil como um<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
filhote de gato, como um beijo de boa noite,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e a ausência do teu mais fugaz olhar,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o esconder-se do mais ligeiro toque<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
do suor das tuas mãos pequenas,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o coloca em apnéia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tu que, ao dormir com a cabeça em<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
meu colo, não soube que ali, aquela hora,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
afagaria teus cabelos até pôr estes dedos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
em carne viva, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
pois que nada (nem mesmo a noite<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de verão em copacabana) tem<o:p></o:p></div>
o teu rosto tão bonito.<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-8257158716760405822013-12-14T21:03:00.001-08:002013-12-14T21:03:54.386-08:00ma flûtiste française<div class="MsoNormal">
“de que adianta vários portos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pra um barco sem âncora?”<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
você me perguntou sem me olhar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
“você é excepcional em desfazer<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
todos os laços possíveis”<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
essas sentenças foram epifanias<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de onde eu via cada nuvem passar<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sobre você: tudo se tornou tão<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
nítido naquela hora<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
teus olhos egípcios voltaram a champs-élysées<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
(quem sou eu para competir com paris!)<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e fiquei aqui morrendo de fome da<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
impiedade crua das tuas unhas mal pintadas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
naufragando sempre em outros cais<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
através das madrugadas lentas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
vou lendo teus bilhetes em francês<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
esperando o efeito de mais um rivotril<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-69844647251408121442013-12-14T20:53:00.001-08:002013-12-14T20:58:55.249-08:00colégio de aplicação<div class="MsoNormal">
o último ônibus chega sem perceber que um corpo dormente
sobe os degraus, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
passa pela roleta sem som algum, onde nada está ali.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
decifro o meu futuro entre linhas de metrô, guerreando
dentro de em um mundo onde tudo é vão, mas evito pensar nisso,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a rua agora recende a uma memória que se esforça pra não ser:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ela dará espaço a outro caminho onde trabalharei
cansadamente<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
como foi tudo nesta vida: entre o sono e o desejo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
não me pertencerão mais estes caminhos suaves, estas horas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
enroladas em papel cartão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
não.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
não serão minhas as tentativas de adivinhar em qual altura
do leblon tu abandonarás estes ônibus vândalos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
mas por agora basta o adeus.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus ao deserto da lagoa sob a chuva, tu serás apenas
trajeto de dias escassos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus a beleza absurda da cabeleira encaracolada, que fugia
da vista como<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
um fantasma sorridente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
até mais banksy, kusama, oiticica, voltarei a falar de vós a
olhos tão ávidos?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
até logo juventude olimpicamente bonita, não poderei perder
teus sorrisos nunca mais, eu que quis ser jovem verdadeiramente e estar entre vós.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus aos teus bombardeios aéreos, a invasão da normandia, e
teus traços de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
musa almodovariana. ingmar bergman acena e também te deseja adeus.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus aos cafés, as vitaminas solitárias, e meu corpo magnificamente
pesado,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a minha flanerie socialmente camuflada sob o sol esforçado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus as geometrias dos corredores entardecidos onde meus
olhos re-<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pousavam. serão
outros, mais distantes, os corredores agora.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus a minha anna karienina e aos nossos crimes de amor<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
platonicamente esotéricos em lumiar,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tivemos um filho e vivemos nus no futuro que não será.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas adeus novamente a minha anna karienina (logo me
esquecerá).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus as calhordices academicamente matutinas as quais eu
não<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pertenço e que me faziam querer chorar, mas hoje, delas, só
posso rir.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus aos abraços, gritos e correrias que me abandonavam
ainda mais<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
tímido, adeus as suas vozes me chamando insistentemente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus aos beijos interrompidos do tigre enfurecido no parque
lage, a tua juventude desorientada secou a nossa chuva, ruiu o nosso cristo, e
eu previ e você não acreditou.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas isso não importa mais, pois agora adeus parque lage, adeus
tigre enfurecido.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus sono sem sonhos após o almoço (o cheiro de couro velho
do sofá).<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus professora tatuada e seus truques com facas, tu que me
ensinou a dança da morte em camas cheias de sol, adeus.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
adeus rebouças, homem negro, túnel negro, e suas babás
negras que iam e voltavam por dentro de ti.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
destas manhãs e tardes torno estes versos um poema em
carne viva,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pois será difícil voltar a amar e odiar como amei e odiei os
teus dias, teus <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pátios, tuas salas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
este poema é uma ode e uma elegia, como o é um filme
expressionista alemão<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
abarrotado de sombras, monstros e musas pálidas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
este poema é o vestígio de um devaneio cuja idade não me
permitirá<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
mais cometer sob a chuva negra e vermelha dos abajures
enfraquecidos.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-8367684412355495422013-10-19T20:54:00.001-07:002013-10-19T21:07:42.287-07:00sobre o conceito de sublime<div class="MsoNormal">
que segredo terrível<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
guarda uma mulher nua<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que sentimento absurdo há no<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
seu corpo a meia luz que<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mais se assemelha a uma<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
ideia simultânea de prazer e dor<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
que abismo é esse que se<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
abre quando ela para de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
frente pro espelho e ajeita os<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cabelos quando ela sorri do <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
outro lado da porta supernovas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
explodem uma efêmera<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
flor desabrocha num segundo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
a luz e sombra dos seus<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quadris o meridiano da sua<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
barriga os peitos semicobertos<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pelo roupão cor de vinho<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
clavículas clavículas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o amor inteiro debruçado na<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
respiração das suas clavículas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
dentre as geometrias das gavetas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
seu corpo é um sol é uma<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
lua é o eclipse tardio que<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
risca o dia como um raio e deixa<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o céu do quarto em carne viva<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
que palavras antigas são essas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sussurradas através das estradas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
em suas pernas (na geografia da<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sua bunda): convites obscuros<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sob a primeira claridade da manhã<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
o que é isso que petrifica e<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mata diante desta mulher nua?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
é o olho da medusa? é o<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
enigma da esfinge? ou é<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
apenas isso sem mistério: ela<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
de calcinha branca tomando sua<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
caneca de café enquanto<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
afogada na luz preguiçosa das cortinas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
caminha pelo quarto lendo ms.<o:p></o:p></div>
dalloway sem notar que já acordei<br />
<div class="MsoNormal">
<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-69459890197366033422013-08-18T01:53:00.001-07:002013-08-18T01:53:30.199-07:00Eva<div class="MsoNormal">
após cada frase dita <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
o modo como você aperta<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os lábios<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
me lembra a julia roberts sorrindo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
não não<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
é mais
bonito ainda:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
o modo como você aperta<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
os
lábios <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
após cada frase dita <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
me faz pensar num tigre-<o:p></o:p></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
de-bengala
dormindo<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5961258776250338471.post-44686362976832968032013-08-13T21:01:00.001-07:002013-08-13T21:01:38.287-07:00ensaio sobre a cor vermelha<div class="MsoNormal">
te imagino bruxa, nua, branca. os<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
cabelos amarrados como os de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
uma camponesa num fotograma de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
pasolini. o teu rosto de perfil na<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
contraluz das janelas antigas, <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
estampado nas tapeçarias bucólicas<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
das antigas casas lusas a beira mar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
dentro da estufa enluarada as<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
folhas em prata, e o diabo sorrindo,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
enquanto você me convida pro<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
teu corpo preso ao silêncio do<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
orvalho e do vidro, esse corpo de<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
um tempo distante:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
odalisca de ingres no jardim botânico.<o:p></o:p></div>
Kavita Kavitahttp://www.blogger.com/profile/04389288702082707921noreply@blogger.com1