Tudo se recolheu em silêncio quando ela cruzou a minha frente imersa no movimento escuro da pista de dança. Entre um e outro copo de cerveja, eu passei a espreitá-la esquivando meus olhos de outros rostos fugidios. Na penumbra barulhenta tudo era impressão, tudo era desfocado, só ela, só a face dela, resistia definível. Uma hora a multidão, como se comprimida pela força dos meus sentidos, se abriu, deixando eu e ela apenas separados pelo desvario dos fachos de luz caleidoscópicos. Isso me imbuía de uma espécie de coragem incerta, que amparada pelas muletas do álcool, me chamava em agonia para ir até ela... mas estanquei quando, no meio do segundo passo adiante, a minha racionalidade entorpecida resolveu elegê-la como a musa intocável daquela noite, e que trocar qualquer palavra com ela seria contar com a possibilidade do seu “não”. Isso acabaria com o encanto, isso mataria aquilo que criei e que só existiu em mim. Fiquei quieto e embriagado no meu canto, entre uma música e outra, entre uma lembrança da Louise e outra, eu ouvia meus amigos me encorajando. Porém, tudo soava tão distante, e eu, com aquele meu sorriso de lado meio blasé, achava tudo de uma tristeza tão bonita...
Meus amigos não sabiam que ali, apoiado nas caixas de cerveja, enquanto a minha angústia começava a soprar em meus ouvidos alguns primeiros versos, eu a tinha por completo, muito mais inteira que qualquer casal daquele lugar poderia ter um ao outro.
Talvez eles nunca saibam que para um poeta, admirar uma coisa, já é vir a habitá-la.
Meus amigos não sabiam que ali, apoiado nas caixas de cerveja, enquanto a minha angústia começava a soprar em meus ouvidos alguns primeiros versos, eu a tinha por completo, muito mais inteira que qualquer casal daquele lugar poderia ter um ao outro.
Talvez eles nunca saibam que para um poeta, admirar uma coisa, já é vir a habitá-la.
Nenhum comentário:
Postar um comentário