domingo, 6 de fevereiro de 2011

Ennui


Antes bicho que homem.
Antes um cupim
um cágado
um urubu-rei.
Antes um bicho que este homem.
Assim não conheceria essa
tristeza que é só de homem.

Meu corpo anda amanhecendo muito lento
meu estar nas horas é quase um sono
toda minha fala é uma nolição da
minha língua...

Queria o poema assim:
altivo em sua dor
imenso de não caber mais todo esse tédio.
Queria um poema como um
non-finito de Michelangelo
este deus frágil que só sobreviveu
enquanto soube fazer sua angústia ir
morar no mármore.

Nasci com esse rosário de vontades
em torno do pescoço e
cada poema
cada masturbação
é uma oração que faço enquanto vou
me esvaindo pelas geometrias do apartamento.
Mas não há paraíso possível a
quem só louva o corpo
(não há Beatriz pura nos lugares onde
desejo estar)...

Só há inferno para quem olha nos
olhos dos pássaros sem mundo
engaiolados nas varandas
e recebe deles o convite para assobiar
o canto dos prisioneiros.

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