sábado, 11 de junho de 2011

Nênia


Amanhece no corpo como
amanhece nas cortinas amareladas.
Tudo dentro já acorda conflito e
se vão ao longe as jovens auroras
as ruas da infância calada
o beijo do primeiro amor...

Vejo uma ladeira sufocada de árvores
nessa manhã fosca de frio metálico onde
as casas dormem enquanto as
pessoas descosem suas vidas nos pontos de ônibus.

Queria a manhã dessas casas
a carne dessas árvores resistindo ao concreto
queria o tempo da lesma o
tempo do caracol na sua monástica vontade de
não alcançar
do que ser esse homem que vive charfundando
na angústia dos horários.

Tudo se corrompe no escorrer
lodoso dos anos e
um dia não mais estarei aqui:
não perscrutarei mais essas rachaduras do muro
(que amanhã já serão diferentes)
não assistirei as novidades do cinema e
nem verei a praia carcomer Copacabana.
Quantas pessoas lindas vão nascer (como
tantas antes de mim) e não as terei ao
menos roçando de leve no meu olho.

Meu olho que um dia estará podre
afundado e murcho em minhas órbitas
e tudo que eu vi esses anos todos
tudo o que capturei
estará eternamente irrecuperável...

Tanto mundo
o mundo inteiro no meu olho
estará dissipado na nulidade do pó.

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