quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Transubstanciação


Acho que a casa de onde vim
vai transbordar de melancolia.
Esvaziada dos livros
dos filmes
das roupas que
trouxe pra cá
penso no vácuo da estante
do armário
das gavetas.

Penso no quarto onde um dia existi.
Sinto-me traidor das paredes que
nunca confessaram a ninguém
os meus crimes e que
antes abrigavam minha solidão
mas que agora saberão ter a sua própria.

Imagino meus pais no epicentro
desse deixar para trás
no saber do último filho saindo
de casa:
deve ser como supor a última
parte da estrada.

Mas fica alguma coisa ainda do tempo
de ser sozinho
em um sobrado rosa que agora
guarda um silêncio a mais
uma ausência a mais
mas que ainda resistirá de pé através
das manhãs de sol nos paralelepípedos
das tardes de chuva na umidade dos muros:
efêmeras marcas dos dias que logo
se perdem nos abismos da memória.

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