sábado, 26 de março de 2011

Olhos de Modigliani


Esta noite sonhei que me suicidava no
abismo das órbitas vazias de Modigliani.
Estranhamente nessa mesma noite
antes de dormir
relia Akhmatova cuja dor faz me apaixonar.

No meio da madrugada pensei nos dois
melancólicos e sentados num café
dentro da monocromia do inverno parisiense:

a poeta com a cabeça na palma da mão
se permitindo um meio-sorriso
branco contra o chumbo da luz de Paris
límpido mas gelado como o seu Nevá.
E o triste pintor de frente pra ela com
seus olhos caídos (realmente caídos)
acima da borda de uma xícara
tendo da cena uma sensação vizinha da alegria.

Pra seres frágeis de tanta sensibilidade
como Modigliani (disso eu sei bem)
o gesto doeu mais que qualquer outra coisa:
no sorriso da amiga
ele foi ferido de morte por um único segundo
habitado por inteiro de duradoura beleza.

Nenhum comentário: