domingo, 22 de junho de 2008

Himeneu Entristecido



Pelas horas de espera adentro
eu rendei um vestido com o fio da solidão...
E me saiu uma peça tão bonita!
É um diáfano vestido de noiva,
cheio de botões de lágrimas cristalizadas,
e feito p’ra ser usado uma única vez,
p’ra depois, roupa-símbolo da noite da minha vida,
durar uma era inteira junto a não-existência das coisas de fundo de armário.
Noventa dias eu te esperei na janela,
vigiando a chuva na cidade,
bordando arabescos de paixão incontida
parindo formas barrocas na cauda longa,
feita inteira com os moldes da saudade.
E quando o mundo nos entregou à nossa hora,
como um anjo me ascendi aos seus altares,
e disse “sim” p’ra tudo o que fosse seu,
e disse “sim” p’ra tudo o que viesse p’ra nós dois.

Mas depois de um tempo, como é normal acontecer,
o mel da nossa Lua apodreceu e amargou...
e eu já não te conhecia mais,
e você já não via mais o meu rosto.
Virei Penélope a te esperar mais uma vez então,
nessa costura infinita,
ainda na janela que vigia a cidade,
agora ensolarada pelo amarelo que irradia seus cabelos.

E se tiver que voltar, meu amor, mande me avisar!
Porque eu tiro o mofo,
exponho ao sol o meu vestido,
e vou me perfumar,
p’ra sair por aí a bailar com você,
sob os olhos escuros do mundo,
naquela nossa antiga ciranda nupcial.

Mas se não conseguir voltar me avise mesmo assim...
porque aí eu me entrego ao choro derradeiro,
e mando cortar o vestido p’ra fazer um lençol branco,
que manterei guardado na gaveta junto as suas fotos,
envolvendo as suas cartas,
até que tudo que é lembrança sua se impregne pelas rendas,
se mescle a constituição do linho e da seda.
Até que seja um tecido de detalhes vazados de memória,
uma fazenda composta de vestígios da sua presença.

Então, quando eu morrer,
irão me cobrir com esse lençol que me fala de você.
Farão dele uma delicada mortalha para meu corpo,
um sudário ornado com a singeleza e dedicação
dos meus dias que foram seus.
E será como sentir sobre a pele o vestido por uma última vez,
será como se eu fosse sua noiva novamente,
ansiosa sobre o altar de velas apagadas do não-ser,
a esperar por toda a eternidade um “sim” que a morte tornou impossível.

2 comentários:

bruna cavalcanti disse...

Moço alegou meu dia ler o seu comentário tão bonito e triste e bonito de novo....assim como este maravilhoso texto...bjos

bruna cavalcanti disse...

Faltou eu dizer uma outra coisa: seu texto é tão lindo que as lágrimas vieram a tona de emoção....singelo de uma forma única e absoluta....