sábado, 11 de dezembro de 2010

Influxo da Manhã


A luz vagarosa perfura
as cortinas
persegue os últimos vestígios da noite
que ainda se escondem nas frestas
da arquitetura
embaixo dos carros
debaixo da pálpebras pesadas dos
que acordam
(mesmo sem despertar).
Amanhece mais um dia e
o primeiro pensamento que
me assalta é:
porque amanhece?

Penso se a manhã de outros países
(que não amanhece
nesse momento) será
a mesma que essa...
será igual para uma estudante chinesa?
para um caçador Massai?
para um operário dinamarquês?
Deles
no entanto
eu não sei
não poderei mesmo saber.
Mas sei das manhãs da senhora que
todo dia
lava seu quintal no Engenho Novo
sei das manhãs da mulher que
todo dia
fuma numa varanda da Lagoa.
Sei da fila de estudantes no ponto
de ônibus em Laranjeiras
das pernas de creme da estudante
que entre as meias e a saia
são da cor lenta da manhã.

E daqui desse amanhecer no Jardim Botânico
até a noite no (talvez no) Méier
tudo será como é desde o início:
a duração de um embate.
Mas quando o crepúsculo se abater novamente
calando a velocidade do dia
enquanto todos sentem na pele a
proximidade do escuro e do sono
(quando não houver mais nenhum
resquício da manhã na hora das coisas)
será o momento de acordar para
os vampiros as putas e os poetas:
pois apenas eles
com os olhos marejados de tanta madrugada
sabem como comungar com
a tessitura íntima da noite.

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