segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Orquidário de Setembro


Não pude dormir na angústia de sentir o perfume expelido do sobe e desce respiratório das suas costas nuas, repousando a um palmo de distância do meu peito. A madrugada correu insípida enquanto eu ansiava que você se virasse sobre o colchão, me olhasse mais uma vez daquele seu jeito, e me abraçasse até chegar a hora de ir trabalhar. Mas pela manhã o relógio tocou, você vestiu a camisola caída atrás da cama, e sem sequer olhar pra mim, me pediu desculpas enquanto ia sonolenta pra cozinha. Estranhamente eu quis levantar e não consegui, fiquei inerte, achei que estava morto até, que era uma alma invisível preocupada em como seria aquele dia inteiro no trabalho, onde o tédio costumeiro jogaria o tempo todo essa lembrança na minha cara, e me traria na boca aquele gosto amargo de fim, que é até bem parecido com o de vinho seco. Por pouco não percebi que estava sendo tomado por uma silenciosa vontade de chorar, só porque estava totalmente distraído no barulho dos talheres que você fazia na cozinha. Mas pra minha surpresa você me trouxe o café na cama, e me fez não saber o que dizer... olhava profundamente, e sem respirar, o copo de Nescau, olhava as torradas e as frutas, como se deles eu pudesse extorquir as palavras que não me existiam até então. Quando o copo de leite, chocolate, e mágoa, já ia pela metade, você perguntou o porque daquele silêncio que não nos cabia. Isso fez com que finalmente passassem a brotar as palavras que não tinham, nascendo uma após outra com dificuldade, formando sentenças que preenchiam o quarto de uma temperatura de desabafo. Choramos abraçados, alheios a todos os minutos que haviam, até que percebêssemos em mudez que nos escapara a hora de ir trabalhar. Quando os sussurros soluçados se cansaram de nós, deixaram em seu lugar um tesão que nos deflagrou uma fúria que atravessou a manhã inteira, a hora do almoço, e fez o dia se esvair em amor... uma paixão que fez a segunda-feira, dentro do seu quarto, se esquecer que era segunda-feira, uma paixão em um pequeno quarto onde, sem esperar, soubemos fazer caber silêncios e gemidos, chocolate e Peter Pan, onde colocamos, de uma vez só, todas as eras e lugares do mundo.

Um comentário:

Karla Moreno disse...

o "Daniela" foi voce q escreveu? mas q magnífico!
Bem, quem sou eu pra criticar e fzr comentários a altura dessa facilidade enorme q voc tem de se expressar e detalhar, usando palavras tao simples e ao mesmo tempo profundas. nossa senhora rs =]
e esse q acabo de ler tbm. estou totalmente sem palavras..
nao vou mentir, quando vejo um texto grande, as vezes pela pressa, dá preguiça de ler, mas os seus textos sao do tipo "eu começo a ler e quanto mais leio mais dá vontade de continuar lendo" rs. entendeu né? simplesmente muito bem escrito, parece q eu tava no msm ambiente descrito e vi tudo, perfeito =)

beijos querido :]