sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Tristitia (ou Do Assassinato Como Uma Das Belas-Artes)


Eu amava as suas sendas tortas
a largura do seu sorriso
eu amava os s(m)eus assassinatos
e você sabia.

Você adorava me ver enforcado na
árvore do seu quintal
meu corpo dependurado balançando
enquanto você batia palmas.
A minha morte era o seu espetáculo.

Eu amava a sua nudez no banho
a sua nudez sonolenta na cama
o seu corpo imenso
(maior que o box do banheiro
maior que a cama
uma galáxia inteira) e
imaginava o cinema:
via você dançando no Blaue Engel
eu fantasiava que você era
a minha Cabíria
a minha pretty woman
a minha belle de jour...
Pois era isso que você era:
uma puta cinematográfica
hollywoodiana
francesa
alemã.
Era todas as mulheres e
portanto
todas as mortes possíveis:
as mais solitárias
as mais doces
as mais duras...

Eu amava os seus cabelos como
garras de leão rasgando o seu rosto
escondendo a sua cara inteira menos
o meio-sorriso malicioso.
Eu amava a sua mão de homem
os seus dedos grossos brutalizando a
fragilidade das coisas.
Eu amava sobretudo o seu
jeito freudiano de ser
quando todos os seus minutos gritavam
em uníssono:
“Todo prazer é erótico!”

Eu amava a sua fenda estreita
a largura do seu sorriso
e
mais que tudo
eu amava e odiava o seu diário suicidar-me.

A sua existência
a sua possibilidade
o trajeto de um lado a outro do seu quadril
já era por si só
o embate de uma vida inteira.

Um comentário:

Joana Rabelo disse...

Luis, isso é lindo.. Perdura e eu
me sinto muda...