quarta-feira, 14 de abril de 2010

Da Adversidade Viemos


Você às vezes me pede pra
escrever poeminhas bonitos...
Mas veja bem menina
como posso versejar coisas bonitas
se entre um CD do Caetano e outro eu
tenho o som das rajadas no Morro do Urubu?
Não dá pra ser esse poeta blasé moderninho
escrever essa poesia Bossa-Nova
se não há posto seis na janela
se do outro lado da rua cruza a toda
o parador do ramal Japeri.

Mas você bem sabe que
eu não quero mesmo o poema que vem
do azul de Ipanema e suas mulheres
esculturadas e queimadas de sol
(às vezes até quero).
Mas não
não quero Vinícius num bar de Copacabana...
quero ser Bukowski na Lapa cheio de
cachaça barata na cara.
Quero ler o futuro nas manchas e
rachaduras do viaduto do Jacaré
e conseguir arrancar poesia também do
riso falso das putas barrigudas de Madureira.

Não sei ver beleza em gestos banais
nunca aprendi a poetizar cotidianos.
O que sei e quero é ferir o bom senso
anestesiar o vazio de viver os dias.

Mas eu soube menina
que as flores de lótus brotam na lama
e talvez eu seja um bom poeta.
Mesmo aqui
contra todas as adversidades
geladeira vazia e paisagem suburbana
não tendo nada a ver com essa juventude que
faz suas lindas poesias nos seus quartos
de apartamento em Botafogo.

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